domingo, 30 de agosto de 2015

Recomendação de Filme #58

A Excêntrica Família de Antônia - Marleen Gorris (1995)

Alguns filmes são verdadeiros achados na nossa vida. Até hoje não consigo descrever exatamente o que senti quando assisti pela primeira vez A Excêntrica Família de Antônia (Antônia), obra-prima da diretora holandesa Marleen Gorris e vencedor do Óscar de melhor filme estrangeiro em 1996. 

O filme é uma verdadeira celebração à vida e à passagem inexorável do tempo, e conseguiu me emocionar como poucos até hoje conseguiram. Famílias que se separam, laços de amizade que se desfazem, amores que se perdem e sonhos que não se realizam. A grande verdade é que o tempo não perdoa ninguém, e a ele nada escapa. Seja para o bem ou para o mal, seus efeitos são inevitáveis, e muitas vezes só percebemos isso quando dele não nos resta mais tanto quanto gostaríamos.


A trama do filme atravessa três gerações de uma mesma família que estabeleceu suas raízes em um pequeno vilarejo no interior da Holanda, e começa com Antônia (Willeke van Ammelrooy), já com seus 90 anos, acordando para aquele que será seu último dia de vida. Ela sente isso, e começa então a relembrar todos os melhores e piores momentos que já vivenciou.

O roteiro volta para 1945, logo após a Segunda Guerra Mundial, quando Antônia retornou à cidade natal para enterrar a mãe, depois de vinte anos distante. Não há nenhuma menção ao que ela teria feito nesse período em que ficou fora, e seu retorno é visto de diversas formas pela população, algumas positivas e outras negativas. A única coisa que ela traz consigo é sua filha pequena, Danielle (Els Dottermans), que poucos sabiam que existia até aquele momento.

A partir de então, começam a surgir todos os demais personagens da estória. Desde uma mulher que uiva para a lua até um casal de deficientes mentais que encontra o amor de uma forma improvável, cada um possui sua própria excentricidade. O que existe de comum entre eles é que todos foram muito bem acolhidos pela matriarca, que sempre fez de tudo para manter a união acima de tudo.


Outro ponto que os aproxima é que em qualquer outro lugar do planeta eles seriam excluídos da sociedade, mas no vilarejo todos se encontram em harmonia, como uma orquestra desafinada que consegue se completar entre os compassos. Entre os demais personagens, dois chamam bastante a atenção: a menina superdotada e o filósofo pessimista, que estuda as obras de Nietzsche e Schopenhauer. Os diálogos entre eles sobre religião são realmente fantásticos, e para mim é o ponto máximo do filme.

Diversas questões sociais também são abordadas magistralmente, como a violência sexual (presente na figura do irmão que estupra a própria irmã), o aborto, a homossexualidade, e a capacidade da mulher de buscar seu espaço em uma sociedade extremamente machista. Aliás, é importante frisar o cunho feminista que a obra possui, já que as ações dos homens da aldeia são geralmente impulsivas e irracionais, e são as mulheres que comandam tudo com pulso firme e independência.


Apesar dos temas densos o roteiro é levado com bom humor, mesclando bem o lado divertido com o lado trágico, e sua forma peculiar de narrar os acontecimentos me lembrou bastante o clássico Cem Anos de Solidão, do escritor Gabriel García Márquez. Por fim, fica a certeza de que é um filme único, em todos os sentidos, e que deveria ser amplamente conhecido. Uma obra onde o tempo é o personagem principal, e nós somos meros espectadores do que ele é capaz.

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