quinta-feira, 30 de abril de 2015

Crítica: Timbuktu (2014)


Retratando uma série de situações provocadas pelo extremismo religioso em um país do norte da África, Timbuktu, do diretor Abderrahmane Sissako, ficará eternamente conhecido por ter conseguido uma façanha e tanto: ser o primeiro filme da Mauritânia a ficar entre os cinco finalistas ao Óscar de melhor filme estrangeiro.



A história principal gira em torno de Kidane (Ibrahim Ahmed dit Pino), um pastor que vive com sua esposa e sua filha em uma pequena cidade no deserto do Mali. Boa parte da vizinhança já foi embora da região depois que ela foi tomada por extremistas islâmicos, mas Kidane, sem ter para onde ir, permanece no local, sem nunca deixar de acreditar que um dia tudo voltará a ser como era antes.

Certo dia, a vaca mais importante de seu rebanho é morta por um pescador depois de atravessar acidentalmente o rio, e na tentativa de buscar justiça Kidane acaba matando o homem. Rapidamente ele é preso pelos extremistas e fica à mercê do seu julgamento e à espera de sua punição, já que assassinato para eles é algo imperdoável (por mais estranho que isso possa parecer aos nossos olhos com tantas barbáries cometidas poe eles noticiadas dia-dia).



Além da história de Kidane, o enredo mostra também outras histórias paralelas, traçando um panorama geral do que mudou na região após a chegada dos fanáticos religiosos. Como amostra dessa opressão que ocorre por lá, o filme cumpre bem seu papel. Algumas cenas são emblemáticas, como o "futebol sem bola", onde jovens tem que fingir estarem jogando futebol para se divertir, já que as práticas esportivas foram expressamente proibidas pelo novo regime. Outra cena bastante forte é a da cantora apedrejada em público simplesmente por querer cantar, já que a música também foi proibida.

O que contribuiu para que o filme tenha se tornado um sucesso em premiações talvez seja o fato do assunto estar mais atual do que nunca. Mas apesar de seus pontos positivos, Timbuktu é um filme que cansa. A narrativa em forma de documentário dá uma realidade a mais para o que vemos, mas falta um aprofundamento maior nos personagens e uma condução mais envolvente. É um filme que tem muito o que mostrar em suas imagens, mas fora isso, acaba sendo dispensável.


terça-feira, 28 de abril de 2015

Crítica: 118 Dias (2014)


Em 2009 o Irã viveu um momento importante de sua história, com uma das eleições presidenciais mais acirradas de todos os tempos. De um lado Mahmoud Ahmadinejad, que tentava a reeleição, do outro, a oposição de Mir Hussein Mussavi, que subia cada vez mais nas pesquisas e vinha conquistando uma boa parcela da população com seu discurso de mudança. Com a vitória de Ahmadinejad, o povo saiu às ruas acusando o governo atual de fraude, e acabou sendo violentamente reprimido.



118 Dias (Rosewater) narra a história real do jornalista Maziar Bahari, vivido por Gael García Bernal, baseando-se em sua autobiografia "Then They Came for Me". Bahari foi enviado ao Irã nesse período como correspondente da revista norte-americana Newsweek para cobrir o pleito, onde conseguiu imagens exclusivas. Uma de suas gravações mostra muito bem repressão violenta da polícia nos protestos, e a imagem que rodou o mundo acabou despertando a ira do governo iraniano.

Acusado de espionagem, Bahari foi preso e passou 118 dias sendo torturado e interrogado incessantemente pelos funcionários da prisão. Durante esse período, foi torturado por um homem que usava um perfume típico com cheiro de rosas (que dá nome ao filme, "Rosewater"). A primeira coisa que incomoda na abordagem do filme é que o protagonista não parece estar sofrendo com a prisão. E se houve mesmo tortura, o filme passou longe de mostrar isso. Fica a dúvida se o tratamento que ele recebeu foi realmente tão brando, ou o diretor que quis amenizar a situação propositalmente.


Apesar da boa premissa o enredo deixa a desejar, e é conduzido de forma muito superficial. Conhecer história do Irã na atualidade não é fundamental, mas ajuda a entender melhor os acontecimentos. Assim como o protagonista, todos os personagens secundários são mal explorados, ainda que possua um elenco de respeito por trás. Nem a boa atuação de Gael García consegue salvar o filme, ainda que tenha seus bons (e poucos) momentos isolados.

Por fim, o filme de estreia de Jon Stewart, conhecido por sua perspicácia em abordar política no seu programa de televisão "The Daily Show", se mostra bastante fraco, e pode ser facilmente descartável. Mais uma biografia indispensável, dentre tantas que tinham tudo para serem boas mas acabaram sendo um tiro n'água.


sexta-feira, 24 de abril de 2015

Crítica: Samba (2015)


Os franceses Eric Toledano e Olivier Nakache ganharam notoriedade em 2011 com o sucesso estrondoso de Intocáveis, que recebeu diversos prêmios e elogios da crítica mundo a fora, além de ser até hoje o maior sucesso de bilheteria de um filme falado em língua francesa. A parceria dos diretores deu tão certo que eles resolveram repetir a dose, e foi então que surgiu a ideia de Samba, que por sua vez já pode ser considerado um dos filmes mais adoráveis de 2015.


Samba Cissé (Omar Sy) é um imigrante senegalês que vive há 10 anos na França, sempre sobrevivendo às custas de pequenos empregos. Com poucas condições, ele divide apartamento com seu tio, um homem de idade que já está há 25 anos no país e que possui um emprego fixo em um restaurante. A aparente normalidade da vida de Samba tem fim quando ele é preso pela polícia francesa, acusado de estar ilegalmente no país.

É a partir desse momento que ele conhece Alice (Charlotte Gainsbourg), uma mulher de meia idade que está começando a trabalhar em uma ONG responsável por ajudar os imigrantes. Fechada em si mesmo e dona de um temperamento difícil, Alice começa a se interessar bastante pela figura de Samba e pela sua história de vida, e entre eles surge uma bonita amizade que muda a vida de ambos.



A intenção primordial do filme é mostrar a dificuldade que existe na vida dos imigrantes na Europa, e como essa situação na maioria das vezes acaba sendo degradante para a dignidade dos mesmos. Porém, isso é mostrado como muito bom humor, o que alivia e muito o sentimento de impotência que se sente ao não poder fazer nada.

Omar Sy, que trabalhou com os diretores em Intocáveis, está mais contido dessa vez, e prova que sabe atuar muito bem em qualquer gênero. Charlotte Gainsbourg despensa comentários, e está impecável como sempre. No entanto, quem rouba a cena mesmo é Tahar Rahim, que faz um papel coadjuvante hilário na pele de um imigrante brasileiro.



Por fim, quem gostou da forma leve e divertida de mostrar os problemas da vida em Intocáveis, vai gostar também de Samba. Um filme despretensioso, que tem a função de mostrar uma realidade triste sob olhos esperançosos, e só por isso merece uma atenção especial.


quinta-feira, 23 de abril de 2015

Crítica: Cinderela (2015)


De uns anos para cá, temos acompanhado uma série de filmes que vieram para estragar contos infantis clássicos, deturpando a estória e, muitas vezes, levando elas ao absurdo completo. Exemplo disso são Branca de Neve e o Caçador, João e Maria - Caçadores de Bruxas e A Garota da Capa Vermelha, esse último levemente baseado na história de Chapeuzinho Vermelho.  Por conta disso, posso me dizer satisfeito após assistir Cinderela (Cinderella), nova versão da Disney para um dos contos mais populares da humanidade, e eu explico o porque.



Pois bem, a história todos já conhecem: uma menina, filha de um comerciante rico, passa a morar com sua malvada madrasta e suas duas filhas depois da morte do pai. Além de perder seu espaço na casa, ela ainda se vê obrigada a fazer todos os afazeres domésticos, sempre sendo motivo de deboche das "irmãs". Tudo muda, porém, quando um rei decide fazer um baile para escolher sua noiva, e Cinderela consegue ir à festividade com ajuda de sua fada-madrinha.

A primeira coisa que se deve elogiar é o fato do enredo do filme não fugir da história original, conseguindo captar com preciosidade toda a magia dos contos de fadas sem ser chato ou apelativo demais. Aliás, achei importante o diretor ter dado uma atenção especial ao que acontece à jovem antes dela ir morar com a madrasta, como a morte da sua mãe por exemplo, o que quase nunca é citado. O filme ainda difere de outros exemplos recentes ao manter Cinderela como uma jovem bela, gentil e ingênua, assim como é nos contos originais, sem tentar remodelar e transformá-la numa mulher de luta e garra. A Disney tentou ser o mais fiel possível, e conseguiu.



Por fim, o ponto alto do filme é certamente o elenco. Para começar, temos Cate Blanchett como a madrasta de Cinderela, impecável diga-se de passagem. Lily James segura bem as pontas como Cinderela, assim como Richard Madden na pele do "príncipe encantado". Quem ainda rouba a cena é Helena Bonham Carter, numa pequena participação como fada-madrinha, papel que lhe caiu como uma luva. Há que se dizer que, de inúmeras versões da história já existentes no cinema, essa já pode ser considerada a definitiva.


segunda-feira, 20 de abril de 2015

Crítica: Como o Vento (2014)


O cinema italiano sempre foi conhecido por seu tom político/crítico, e pela competência com que trata isso nas telas. Sendo drama, suspense ou até mesmo comédia, os filmes da país sempre buscaram trazer reflexões acerca da política, não só regional, como mundial, e Como o Vento (Come il Vento) não foge disso.



No filme do diretor Marco S. Puccioni, acompanhamos a história real de Armida Misere (Valeria Golino), uma mulher de muita coragem e determinação, que ganhou notoriedade e respeito por ter sido uma das primeiras mulheres a assumir o cargo de diretora em uma penitenciária. Além de mostrar um pouco da sua carreira, o filme vai mais a fundo em sua história de vida, mostrando todo o sofrimento pessoal pelo qual ela passou.

Mesmo recebendo ameaças e sendo muitas vezes desrespeitada pelos detentos, ela nunca desistiu da profissão, o que acabou trazendo uma série de problemas pessoais no decorrer dos anos. O pior deles foi a morte do marido, Umberto Mormile (Filippo Timi), que ocorre logo no começo do filme e serve de base para o restante do enredo. 



Enquanto comanda as prisões mais perigosas da Itália e bate de frente com a máfia, ela não desiste de investigar e tentar descobrir quem foram os responsáveis por trás da morte do marido, e através de flashbacks, acompanhamos essa busca incessante pela verdade. 

O ponto positivo do filme é a atuação de Valeria Golino, que tirou de letra uma personagem bastante complexa. O enredo é bem redondo e prende até o fim a atenção, e por tudo isso, posso dizer que Como o Vento é um dos filmes italianos mais interessantes dos últimos anos.


quinta-feira, 16 de abril de 2015

Crítica: As Horas Mortas (2013)


Bastante elogiado na 37ª mostra de cinema de São Paulo, o mexicano As Horas Mortas (Las Horas Muertas), do diretor Aarón Fernandez, é um filme simples e com um baixíssimo orçamento, mas prova mais uma vez que não se precisa de muito para se levar às telas uma boa história.


Um senhor de idade é dono de um pequeno motel no pacato litoral de Veracruz, no México. Quando ele precisa se ausentar por um mês para fazer uma bateria de exames em outra cidade, ele deixa seu sobrinho Sebatián (Krystian Ferrer) cuidando do negócio. Apesar da pouca idade, 16 anos, o garoto se mostra competente na missão, e vai levando o dia-dia com muita tranquilidade.

Entre os poucos clientes do motel está Miranda (Adriana Paz), uma mulher mais velha que mantém encontros casuais com um homem casado, sempre no mesmo quarto. Enquanto espera pelo amante, ela começa a puxar conversa com Sebastián e entre eles nasce uma sincera amizade, onde trocam boas observações sobre a vida.

O filme é singelo e extremamente simples, e o roteiro redondinho não deixa nada a desejar. A narrativa é linear, sem nenhum momento de "clímax", o que pode incomodar quem não gosta de filmes parados. Para mim, no entanto, isso faz com que a estória seja ainda mais realista e por isso mesmo é um ponto positivo. As atuações são boas, assim como a fotografia, sempre contando com a bela imagem do mar de fundo.


Por fim, o que move As Horas Mortas é a espera. Sebastián espera por clientes e pela volta do tio, enquanto Miranda espera por seu amante, e é essa solidão silenciosa de ambos que os une. Despretensioso, é um pequeno filme com grande essência.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Crítica: Magical Girl (2015)


Com uma das propostas mais estimulantes surgidas no sempre competente cinema espanhol nos últimos anos, Magical Girl aparenta ser uma coisa e acaba sendo outra completamente diferente, e a surpresa nesse caso acaba sendo super bem-vinda.


Alicia (Lucia Pollán) é uma menina com leucemia que sonha ter o vestido de um famoso desenho japonês. Sabendo do pouco tempo de vida que ainda resta para a filha, Luis (Luis Bermejo), um professor de literatura desempregado, começa uma corrida contra o tempo para juntar dinheiro e realizar o sonho da menina. O elevado preço o assusta mas não o faz desistir, nem que para isso ele tenha que vender coisas preciosas como sua extensa coleção de livros.

O caminho de Luis acaba cruzando com o de Bárbara (Bárbara Lennie), uma jovem com transtornos mentais que vive com seu marido em um apartamento. Depois de ter um segredo de Bárbara em mãos, Luis passa a chantageá-la para que ela lhe dê dinheiro, ameaçando contar toda a verdade para o marido. Com medo, e precisando arrumar o dinheiro a todo custo, Bárbara acaba se metendo em um negócio obscuro, sem medir o perigo e as consequências que isso traria para sua vida.


Não quero entrar muito na história sob risco de soltar spoilers, mas o fato mais interessante é que as partes mais amedrontadoras do filme (principalmente a última sequência) não são mostradas, ficando apenas para nós imaginarmos. E na imaginação vocês sabem, vale tudo.

O enredo é bem construído e a estética visual também chama a atenção. Os atores trabalham muito bem, com destaque para José Sacristán, que faz o papel de um professor aposentado que ajuda Bárbara do meio para o final da história. Eleito melhor filme no festival de San Sebástian, na Espanha, Magical Girl é um filme simples mas que prende o espectador até o final, e só por isso já vale a pena ser visto.

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Crítica: A Pequena Morte (2015)


Conhecido principalmente pela série de televisão House of Lies, o australiano John Lawson resolveu se aventurar pela primeira vez como diretor e roteirista de cinema na comédia A Pequena Morte (The Little Death), e não fez feio. Mostrando histórias distintas que no fim se entrelaçam, Lawson explora em 90 minutos a vida sexual secreta de cinco casais que vivem em Sidney, com seus problemas, suas neuras e suas fantasias.



O longa começa mostrando Paul (Josh Lawson) e Maeve (Bojana Novakovic), jovem casal que começa a ter dificuldades com o sexo depois que ela confessa na cama ter a fantasia de ser estuprada. Obviamente não seria um estupro de verdade, e a ideia é que o marido se passe por um desconhecido com a maior veracidade possível. Paul acaba aceitando o "desafio" e começa a fazer de tudo para realizar a fantasia da esposa, mas isso acaba levando-o longe demais.

A segunda história mostra Daniel (Daniel Malcolm) e Evie (Kate Mulvani), que estão passando por uma crise sexual no casamento e buscam na terapia uma solução. Na tentativa de apimentar a relação, o médico sugere então que eles brinquem de interpretar personagens na hora H. A brincadeira começa bem, mas a falta de aptidão de Daniel para conseguir ser convincente na dramatização é extremamente cômico e acaba estragando tudo.



Logo passamos a acompanhar Richard (Patrick Brammall) e Rowena (Kate Box), que há cinco anos tentam ter um filho mas sem sucesso. A coisa muda de figura quando Rowena descobre uma tara sua esquisita e até então desconhecida: ela sente prazer em ver o companheiro chorar. A partir de então, ela começa a fazer tudo que pode para que ele chore, nem que para isso tenha que transformar a vida dele num inferno.

Phil (Alan Dukes) e Maureen (Lisa McCune) vivem um casamento de anos e brigam o tempo inteiro quando estão juntos. Consequentemente eles não fazem sexo, e ele acaba tendo que se satisfazer sozinho depois que a esposa dorme. O diferencial nessa história é que Phil possui uma tara incomum ao se sentir excitado vendo outra pessoa dormir, e quando Maureen começa a tomar remédios para dormir ele aproveita para curtir momentos românticos junto dela sem ela saber.

Por fim, vem a parte mais interessante de todo o filme para mim, e uma das sequências mais bacanas que o cinema já produziu. Monica (Erin James) trabalha numa empresa cuja sua tarefa é fazer o intermédio de ligações entre surdos e mudos através do Skype. O problema começa quando Sam (T.J. Power), um desenhista gráfico solitário, liga para lá e pede para que ela faça a ligação para um tele-sexo. Monica então se vê obrigada a traduzir toda a conversa, e o que parecia constrangedor no começo acaba unindo os dois de uma forma muito singela.



Com esquetes engraçadas e muito bem montadas, A Pequena Morte pode ser considerada uma das comédias mais inteligentes e bacanas dos últimos anos, diferente de tudo que já foi feito. As atuações são muito boas, assim como a trilha sonora, e mesmo sendo uma comédia, faz refletir um pouco sobre o papel da sexualidade na vida de um casal, e nas tantas maneiras disso ser responsável pelo sucesso ou não de uma relação. Certamente uma das surpresas mais positivas do ano.


segunda-feira, 6 de abril de 2015

Crítica: 14 Estações de Maria (2015)


Ainda estamos no mês de abril mas, para mim, o alemão 14 Estações de Maria (Kreuzweg) já é um dos melhores filmes lançados no Brasil em 2015. Vencedor do Urso de Prata de melhor roteiro e de melhor filme do júri ecumênico no último Festival de Berlim, o filme dos irmãos Bruggemann é uma das críticas mais contundentes contra o dogmatismo religioso que já tive a chance de assistir.


O longa já começa mostrando a que veio na primeira cena, onde durante 15 minutos com a câmera estática, acompanhamos um padre declamando todos os ensinamentos básicos da igreja católica a adolescentes que estão às vésperas da sua crisma. Da adoração e o culto à figura de Jesus a criação de um "exército da salvação", ele passa por todos os tópicos mais importantes do cristianismo, fazendo aquela "lavagem cerebral" que todos sabemos que existe nas igrejas mais ortodoxas.

Entre esses jovens está Maria (Lea Van Acken), uma menina tímida e quieta, que desde cedo recebeu dos pais, sobretudo da mãe, um tratamento religioso extremamente rigoroso. Obrigada a seguir à risca todas as regras sociais que a igreja impõe, ela não tem direito a brincadeiras, não tem direito a ter amigos. Fica fora da própria educação física da escola por acreditar que a música da aeróbica é diabólica, e por isso é rechaçada por todos os colegas.


Vivendo em um mundo onde a diversão é pecado e o medo de não ir pro céu é tão grande quanto qualquer outra coisa, Maria se mostra cada vez mais distante do que se esperaria de uma menina de sua idade. O pior de tudo é que ela é realmente levada a acreditar em tudo que ouve, e por isso se fecha propositalmente para o mundo exterior. Se você for reparar, as pessoas fanáticas raramente sorriem, raramente fazem algo que gosta, e o filme mostra com competência o impacto que essa criação acaba tendo num adolescente que está dando os primeiros passos da vida adulta. 

No enredo, não há uma cena sequer que não tenha uma intensidade dramática. Aliás, a divisão em capítulos foi uma excelente escolha. Cada capítulo faz uma referência aos 14 passos da via sacra de Jesus descritos na bíblia (que eu confesso que não conhecia até então), fazendo ligação entre eles e a história vista em cena. Outro ponto alto do filme são as atuações, principalmente de Lea Van Acken e Franziska Weisz, que faz o papel da mãe de Maria.


Sem escolher um lado, se preocupando apenas em mostrar friamente o dia-dia de quem enfrenta esse "martírio" sem opção de escolha, o diretor deixa ao espectador a função de definir se isso é certo ou errado. Infelizmente, sabemos que filmes como 14 Estações de Maria são pouco divulgados por aqui, mas se você tiver a chance de assistir, não deve perder. Vale a pena cada segundo.